Citações

Citações de discursos ou escritos de António Lobo Antunes recolhidas em livros, entrevistas, apresentações e outros eventos



Todos os homens quando estão aflitos querem a mãe, tenham a idade que tiverem.
fonte: Visão, 10.12.2015

Todos nós temos uma criada de servir cá dentro, no sentido antigo da palavra. Todos nós somos muito pirosos.
fonte: Visão, 10.12.2015

Os homens não merecem as mulheres, reduzem tudo à genitalidade.
fonte: Visão, 10.12.2015

Não se pode escrever um bom romance antes de ter vivido.
fonte: Visão, 10.12.2015

Nada se inventa. Pode-se misturar as coisas, ou mostrar só metade, mas todos os livros falam da mesma coisa. E todos os escritores são uniformemente infelizes. Porque se fossem felizes não tinham necessidade de passar 16 horas por dia a escrever. Há uma dor com que se nasce… Os artistas sofrem muito.
fonte: Visão, 10.12.2015

Temos a mania de que a inteligência é a maior virtude, mas a bondade é maior.
fonte: Diário de Notícias, 05.12.2015

Fiz mais por Portugal do que estes políticos juntos, pus a bandeira nos mastros das principais capitais da Europa. Vaidade não é, trata-se do que aconteceu. Da Áustria a Isarael, e com o meu nome vem Portugal. Eu pouco interesso, é o país.
fonte: Diário de Notícias, 05.12.2015

Ficamos melhor quando passamos pela provação do sofrimento. Mais tolerantes.
fonte: Diário de Notícias, 05.12.2015

Não tenho dúvida em dizer que ninguém escreve como eu, mas não sou eu, é o António Lobo Antunes, que é uma pessoa que ninguém sabe quem é. Porque o eu é um menino assustado, muitas vezes com medo e por vezes perdido.
fonte: Diário de Notícias, 05.12.2015

Acho que escrevemos livros porque se sofre. E os intervalos entre os livros é um sofrimento ainda maior.
fonte: Diário de Notícias, 05.12.2015

Aprendi mais com alguns saxofonistas de jazz como John Coltrane ou Charlie Parker do que com escritores.
fonte: El País, 19.09.2015

Não me interessa escrever romances de guerra por respeito aos mortos.
fonte: El País, 19.09.2015

O prestígio são os escritores que dão ao[s] prémio[s literários], não ao contrário.
fonte: El País, 19.09.2015

Pouco importa o que o tempo julgue. O que importa é que a gente escreva.
fonte: LER, Dezembro 2014

Falam-me de escritores que me imitam. Agora há Antunes por todo o lado. Isso não é bom. A gente tem que escrever contra os escritores de que gosta.
fonte: LER, Dezembro 2014

É agradável as pessoas gostarem do nosso trabalho. Temos uma sede infinita de amor. E de reconhecimento. Por muito certos que estejamos do nosso talento e da nossa capacidade de escrever. fonte: Visão, 13.11.2014

Os portugueses merecem muito melhor, merecem muito mais do que o Governo que têm, muito mais do que a maneira como os obrigam a viver. Já ouviu um discurso do primeiro-ministro? A quantidade de erros de português que ele dá... Como é que podemos ser governados por pessoas que nem sequer sabem falar português? Não posso com esta mediocridade, com este vazio de ideias, com esta mentira constante. 'Decisão irrevogável'? O meu pai nunca admitiria que um filho seu voltasse atrás com a palavra. E isto passa-se no mundo inteiro. Há pouco tempo, George Steiner comentou comigo que nenhum dos bons alunos de Cambridge ia para a política: só os medíocres vão para a política.
fonte: Visão, 13.11.2014

Eu só sou o António Lobo Antunes com o papel na mão. Sem o papel na mão, sou um chato.
fonte: Visão, 13.11.2014

Acho que tenho orgulho no meu trabalho, não me apetece morrer mas acho que já morria em paz.
fonte: Público, 07.11.2014

Tenho uma memória péssima, lembro-me de tudo. Parece aqueles tecidos a que se pega tudo.
fonte: Público, 07.11.2014

Venho de gente muito humilde. Não na geração do meu pai nem da do meu avô, mas nas anteriores. O meu brasão só tem enxadas.
fonte: Público, 07.11.2014

As nossas ideias misturam-se tanto com as nossas paixões. Eu gosto, logo é bom; eu não gosto, logo é mau. A crítica é sempre muito emocional.
fonte: Público, 07.11.2014

Eu sei que ninguém escreve como eu. Nem eu mesmo.
fonte: El País, 23.01.2014

[Os livros são] como estátuas enterradas no jardim que há que desenterrar, e depois limpar e limpar. Talvez um livro seja uma eficaz, solitária e longa palavra.
fonte: El País, 23.01.2014

A covardia, fisicamente, é feia. Reduz-te a um ser miserável, despojado de toda a dignidade de homem.
fonte: El País, 23.01.2014

As pessoas gostam [das crónicas] porque são como piscinas para crianças. É impossível afogar-se. Os livros, por sua vez, são feitos para que se afoguem.
fonte: El País, 23.01.2014

Eu gosto da parte masculina das mulheres, mas não gosto da parte feminina dos homens. Gosto dos homens que são tão homens que não têm medo de serem mulheres.
fonte: Visão, 19.12.2013

Um livro acaba quando a gente sente que o livro está farto de nós, já não aguenta mais correções. Como quando nos querem beijar e já não nos apetece mais, e os lábios parecem bifes, e se nos tocam, a gente deita-se na pontinha da cama, na esperança de que não nos toquem mais...
fonte: Visão, 19.12.2013

No amor, o ciúme é normal, e até posso aceitar o sentimento de posse. Na amizade, isso não existe, os nossos amigos têm outros amigos, e nós aceitamos isso. Mas talvez não sejam sentimentos tão diferentes... Para mim, a amizade é completamente assexuada, não sou capaz de sexualizar uma amizade, nunca fui, mas no amor às vezes também não. Porque o amor é tanto, que a gente fica sufocada de paixão e nem pensa em sexo, ficamos a olhar apenas, só o privilégio de poder estar a olhar... e existe aquela sensação de que se tocar vou estragar, porque posso fazer ali uma nódoa, um amolgão, qualquer coisa...
fonte: Visão, 19.12.2013

Quando estou com um livro estou sempre agarrado a ele e sobra pouco para os outros.
fonte: Visão, 19.12.2013

É um milagre tão grande fazer um filho, depois ficam uns adultos chatos, mas ali são só nossos, ou talvez não sejam nossos, mas não são de mais ninguém.
fonte: Visão, 19.12.2013

Ler um livro bom é uma alegria tão grande. Por isso, eu não entendo a inveja e a rivalidade entre escritores, porque isto não é nenhum desporto de competição. Não faz sentido a inveja em arte.
fonte: Visão, 19.12.2013

Chega-se a uma altura em que a gente compreende que, às vezes, é mais importante estar de mão dada no sofá do que a fazer amor. E que isso pode ser mais íntimo, mais profundo e dar um prazer de uma intensidade muito grande.
fonte: Visão, 19.12.2013

Eu sinto que tenho livros para fazer, às vezes penso que sou como uma vaca, ou égua, ou cabra, que ainda pode engravidar mais três ou quatro vezes. Gostava de continuar a escrever. Às vezes penso que talvez tenhamos nascido com certo número de livros cá dentro. Se eu não os escrever, a minha vida não tem sentido.
fonte: Visão, 19.12.2013

Eu não sou grande espingarda na alegria, de facto. Nunca fui extrovertido nem alegre e sinto esta sede de amor e de ternura inextinguível...
fonte: Visão, 19.12.2013

A amizade é como o amor, a gente encontra uma pessoa e fica amigo de infância.
fonte: Visão, 19.12.2013

Eu tinha uma ideia completamente romântica. Pensava que houvesse uma grande fraternidade entre os artistas, mas não há. Há mesquinhês, inveja, competição....
fonte: Jornal de Leiria, 22.11.2012

A maior parte dos livros começam quando a gente acaba de os ler, começam a fazer o seu caminho dentro de nós.
fonte: Jornal de Leiria, 22.11.2012

Eu não gosto de livros fáceis como não gosto de mulheres óbvias.
fonte: Jornal de Leiria, 22.11.2012

A cultura mete medo porque em si mesma é subversiva, no sentido mais lato, no sentido político. Porque as pessoas começam a exigir outras coisas. De maneira que a gente vai-lhes dando Big Brothers, Rodrigues dos Santos, essas coisas, novelas, onde tudo é óbvio, nada nos incomoda, nada nos estremece, nada nos faz exigir mais. Um povo culto é muito perigoso.
fonte: Jornal de Leiria, 22.11.2012

Quando estava na América tinha uma namorada norueguesa e na intimidade, nos momentos supremos, parecia que se estava a afogar na banheira: “borum, borum, borum”. Era uma coisa horrorosa e eu tinha saudades de Portugal porque ao menos gemem na minha língua.
fonte: Jornal de Leiria, 22.11.2012

Os filhos têm um pavor horrível que os pais sejam fracos. Nenhum filho quer mandar em casa. Nenhum filho quer que o pai seja amigo. Quer que o pai seja pai e que a mãe seja mãe. E nós temos tendência para nos demitirmos disso.
fonte: Jornal de Leiria, 22.11.2012

Confundimos amor com outras coisas: com gratidão, com acomodação, com a defesa contra a solidão. Nunca encontrei uma definição satisfatória do que é o amor entre um homem e uma mulher.
fonte: La Vanguardia, 21.02.2012

Penso que toda a tradução é impossível: é como a fotocópia a preto e branco de um quadro, creio que muita coisa se perde pelo caminho...
fonte: La Vanguardia, 21.02.2012

Tem que se entrar num livro sem ideias pré-concebidas. Enquanto se lê por vezes pode ter-se a sensação de não se estar a entender nada, mas isso está bem, porque depois, subitamente, entende-se tudo: o escuro torna-se claro.
fonte: El País, 14.01.2012

Enquanto se escreve não se pode pensar no leitor. Se se piscar o olho ao leitor, o livro vai ser mau.
fonte: El País, 14.01.2012

Escrevo à mão, porque é como bordar, gosto do cheiro do papel, gosto dessa coisa artesanal da escrita, o desenho das letras.
fonte: El País, 14.01.2012

Não acredito que as pessoas que aparecem nas revistas - actrizes, modelos e apresentadoras - leiam um livro. Posso estar enganado, se calhar lêem imenso, mas não me parece, pelo modo como falam.
fonte: Diário de Notícias, 02.10.2011

Tenho medo dos políticos, porque gostam de substantivos abstractos em vez das pessoas.
fonte: Diário de Notícias, 02.10.2011

O escritor só escreve, depois há um cidadão que de vez em quando se aborrece.
fonte: Diário de Notícias, 02.10.2011

O livro faz-se como ele quer. Nem é o que deve, nem é o que eu quero, é o que ele quer.
fonte: Diário de Notícias, 02.10.2011

Desde o 25 de Abril, quem fez alguma coisa pela cultura em Portugal? Não tenho resposta. As autarquias, algumas, sem dúvida. Do Estado, nunca vi. Fosse ministro, fosse secretário de Estado. Essa é a minha sensação.
fonte: Diário de Notícias, 02.10.2011

Claro que tenho orgulho no que fiz, e se me perguntarem "acha que alguém escreve como você?", eu seria hipócrita se dissesse que achava que havia.
fonte: Diário de Notícias, 02.10.2011

Tenho sempre medo de desiludir as pessoas e, sobretudo, de me desiludir a mim mesmo.
fonte: Diário de Notícias, 02.10.2011

O meu receio é começar a perder faculdades sem ter crítica em relação a isso. Mas ainda sinto força e, se Deus quiser, gostava de morrer com uma caneta na mão.
fonte: Diário de Notícias, 02.10.2011

Temos todas as idades na nossa vida e todas as vidas dentro de nós. É o que nos permite escrever.
fonte: Jornal de Letras, 21.09.2011

Ainda estou a aprender a escrever estes livros que faço. É a minha única preocupação.
fonte: Jornal de Letras, 21.09.2011

Para começar a escrever, preciso de alguns factos reais.
fonte: Jornal de Letras, 21.09.2011

Quando comecei a ensurdecer a minha escrita mudou: passei a ouvir muito melhor as vozes. Ensurdecer foi socialmente uma chatice e literariamente uma bênção.
fonte: Jornal de Letras, 21.09.2011

Toda a criação é simbólica. A história é apenas o isco que se usa para atrair o leitor à verdade dos símbolos.
fonte: Jornal de Letras, 21.09.2011

Durante muitos anos havia uma coisa que me intrigava: a sensação que temos, quando estamos entre o dormir e o acordar, de ter percebido o segredo do mundo. De que tudo é simples e claro.
fonte: Jornal de Letras, 21.09.2011

Nós, quando estamos a escrever, estamos a aprender a escrever, também, porque qualquer livro bom é um livro sobre como escrever. Qualquer bom escritor está a ensinar-nos a lê-lo.
fonte: Visão, 28.10.2010

A única coisa que eu sempre achei que tinha era a capacidade de escrever coisas em que pudesse dar às pessoas de quem gostava aquilo que não era capaz de lhes dar.
fonte: Visão, 28.10.2010

A gente não pode levar a morte a sério. Há que aceitar a morte como a impostora que é.
fonte: Visão, 28.10.2010

A gente só tem perguntas, e quando encontra respostas elas transformam-se em novas perguntas. Então, nunca faremos o livro que queremos, porque pode-se sempre ir mais longe. E, se conseguirmos trazer uma coisa que achamos nova, percebemos que essa coisa é uma porta que dá para outra coisa ainda, e outra, e outra, e outra.
fonte: Visão, 28.10.2010

Até há pouco tempo, o que me interessava era descobrir novas formas de dizer. Neste momento, é como se já tivesse um território conquistado, e só o quero é consolidar. Já delimitei as fronteiras e não vou sair delas. Construí o meu país, interessa-me aprofundá-lo e dar notícia dele. Fazer uma cartografia das emoções. Essencialmente é isto.
fonte: Diário de Notícias, 28.10.2010

Um livro só com técnica e sem emoção é frio e sem charme; um só com emoção é um delírio estruturado.
fonte: Diário de Notícias, 28.10.2010

Eu disse várias vezes que ia deixar de escrever e tenho a maior vontade de o fazer. Simplesmente não sou capaz, porque a minha vida fica completamente sem sentido.
fonte: Diário de Notícias, 28.10.2010

Enquanto leitor, se um livro é bom, ele começa a fazer um percurso dentro de mim quando acabo de o ler. Essas vozes tornam-se cúmplices, amigos e companheiros de viagem porque continuam vivas connosco.
fonte: Diário de Notícias, 28.10.2010

Cada vez menos há espaço para a grande literatura. As pessoas passam o tempo no Facebook, na Internet, comunicam-se por e-mail e eliminaram a correspondência.
fonte: Diário de Notícias, 28.10.2010

Este [escrever] é um ofício de paciência.
fonte: Expresso - Revista Única, 16.10.2010

Não quero dar nenhuma ideia ao leitor acerca do livro. Tem de se vender sozinho. Quando o publico, é porque estou contente com ele. O importante é que chegue ao bom leitor.
fonte: Expresso - Revista Única, 16.10.2010

O meu trabalho é escrever livros, não falar sobre eles.
fonte: Expresso - Revista Única, 16.10.2010

Toda a invenção é memória. [...] Quem nos arranja os materiais é a memória. As tais coisas de que a gente não fala e aparecem nos livros, de maneiras desviadas.
fonte: Expresso - Revista Única, 16.10.2010

Os homens nuca dizem: "Já não gosto." Dizem: "O problema não está em ti, está em mim Preciso de pensar, preciso de espaço..." As mulheres são muito mais directas: "Deixei de gostar de ti." E pronto. Os homens nunca o dizem porque querem que a mulher fique de reserva.
fonte: Expresso - Revista Única, 16.10.2010

Como leitor, gosto de livros grandes. Começo a gostar de um livro precisamente ao fim de duzentas páginas.
fonte: Expresso - Revista Única, 16.10.2010

[O que é um bom leitor?] É um leitor que fala para o livro.
fonte: Expresso - Revista Única, 16.10.2010

A reforma ortográfica é sobretudo uma questão económica.
fonte: CBN, Julho de 2009

[A guerra colonial] era uma guerra de crianças... era o Vietname dos pobres.
fonte: CBN, Julho de 2009

O meu país é onde eu me sinto bem, é onde estão as pessoas de quem gosto, o lugar é-me indiferente.
fonte: CBN, Julho de 2009

A noção de Pátria ou de País... foi em nome disso que me mandaram para a guerra, e vi morrer muita gente em nome desses substantivos abstractos. Isso muda sua noção de patriotismo.
fonte: CBN, Julho de 2009

Para mim o Brasil não é um país, é uma coisa familiar, íntima.
fonte: CBN, Julho de 2009

Ninguém escreve para si, isso é uma mentira.
fonte: entrevista exclusiva, 18.02.2009

Um homem sem amigos é um pobre. 
fonte: entrevista exclusiva, 18.02.2009

Não creio que haja poucos leitores em Portugal.
fonte: entrevista exclusiva, 18.02.2009

Os prémios nada têm que ver com a literatura, no sentido em que não torna os livros bons ou maus, melhores ou piores.
fonte: entrevista exclusiva, 18.02.2009

De onde vêm os livros é uma coisa que sempre me intrigou. De que região nossa? Ou será que é uma região de outra pessoa? Quem escreve? É a minha mão que escreve, é outra mão na minha mão? É meditado?
fonte: Diário de Notícias, 16.02.2009

Precisava de ter dez vidas: oito para escrever, uma para ser médico e outra para escrever sobre teoria da literatura.
fonte: Diário de Notícias, 16.02.2009

Cada vez é mais difícil ler. Tudo o que leio é pior que aquilo que faço, tenho vontade de começar a corrigir tudo.
fonte: Diário de Notícias, 16.02.2009

Ser arte é ser útil.
fonte: Diário de Notícias, 16.02.2009

Só vale a pena escrever se tiver a convicção profunda de que tem de ser o melhor. Sabendo que, no fundo, é apenas o elo de uma corrente que começou muito antes de si e acabará muito depois.
fonte: Ler, Maio de 2008

Eu não escrevia por estar motivado. Escrevia porque tinha de escrever [...] Não sei explicar de onde é que isto vem. Sei lá, deve ser pela mesma razão que a pereira dá peras.
fonte: Ler, Maio de 2008

Escrever é sobretudo uma questão de trabalho. Há um dom que lhe é dado mas se não trabalhar muito de nada lhe serve. É tudo conquistado penosamente. Aliás, quando está a sair com facilidade, eu desconfio logo. Aquilo que vem muito depressa não pode ser bom.
fonte: Ler, Maio de 2008

Cada vez mais, quando acabo um livro, o meu medo é o de já estar a rapar o fundo ao tacho. A sensação de que nasci com um certo número de livros e que, se calhar, eles já acabaram.
fonte: Ler, Maio de 2008

Cada vez começo um livro com menos coisas. Depois, se o livro é livro, anda sozinho. Faz-se a si mesmo. Às vezes, tenho a impressão de estar a assistir.
fonte: Ler, Maio de 2008

Ao acabar-se um dia de trabalho, no dia seguinte o livro inflecte. Às vezes dá-me vontade de continuar a escrever por mais horas. O que eu faço, então, é parar, se possível, a meio de uma frase. Se possível, a meio de uma palavra. Para tentar não torcer muito o rumo ao livro.
fonte: Ler, Maio de 2008

Eu gostava que o leitor se descobrisse a si mesmo, também, nos meus livros. A si mesmo e ao autor, ao mesmo tempo. Nós somos todos tão parecidos. Todos.
fonte: Ler, Maio de 2008

Eu desconfio dos tradutores que não têm dúvidas.
fonte: Ler, Maio de 2008

A leitura é uma coisa que se educa. Que se ensina e que se aprende. O problema é que qualquer grande escritor tem de ensinar os seus leitores a lê-lo. O grande juiz acaba sempre por ser o tempo.
fonte: Ler, Maio de 2008

Nunca usei alguém que tivesse tratado [enquanto médico] para pôr num livro. Deus me livre. Isso eu não faria nunca.
fonte: Ler, Maio de 2008

Como cidadão praticamente não existo. [...] Não frequento eventos, não participo em nada. Tenho uma vida muito solitária, muito fechada. Tenho poucos amigos. Com esses dou-me, claro. Portanto não faço vida social.
fonte: Ler, Maio de 2008

Cada livro é uma ruptura em relação ao anterior, embora seja uma ruptura dentro de uma certa continuidade que é a procura de um livro ideal.
fonte: Sol - suplemento Tabu, 02.02.2008

Ganho a vida a escrever livros. As pessoas estão todas no trabalho e eu não posso estar sem fazer nada.
fonte: Sol - suplemento Tabu, 02.02.2008

Se os livros fossem publicados anonimamente, sem o nome do autor, resolvia imensos problemas. Ou então deviam ter o nome do leitor, porque é ele que escreve o livro.
fonte: Sol - suplemento Tabu, 02.02.2008

A morte tem os nossos olhos.
fonte: Sol - suplemento Tabu, 02.02.2008

Não há honestidades possíveis. Ou há honestidade ou não há.
fonte: Sol - suplemento Tabu, 02.02.2008

É muito difícil ler. São oito horas a trabalhar; não sei quanto tempo em transportes e a família. Não há muito tempo e, no entanto, acho que em Portugal se lê bastante.
fonte: Sol - suplemento Tabu, 02.02.2008

Ainda é cedo para avaliar o que faço. A mim, pelo menos, há uma parte que escapa. [...] Todos escrevemos para mudar a arte de escrever. Tchekhóv e o Conrad mudaram-na, mas há muitos mais. Não sou mais do que um elo que começou muito antes de mim e acabará muito depois.
fonte: Jornal de Notícias, 20.01.2008

Fico parvo quando vejo escritores que escrevem 30 ou 40 páginas por dia. Quando escrevo uma, é uma sorte.
fonte: Jornal de Notícias, 20.01.2008

É importante escrever, não publicar.
fonte: Jornal de Notícias, 20.01.2008

Nunca percebi porque motivo tentaram colar-me essa imagem de mal-educado. Não sou nada disso.
fonte: Jornal de Notícias, 20.01.2008

Há um punhado de tradutores portugueses de elevadíssima qualidade.
fonte: Jornal de Notícias, 20.01.2008

Interessa-me apenas a parte da cultura. É por isso que admiro as editoras pequenas. As grandes, pelo contrário, são máquinas de fazer dinheiro.
fonte: Jornal de Notícias, 20.01.2008

A única duração que posso ter é a que os livros tiverem.
fonte: Diário de Notícias, 30.09.2007

É inútil lutar contra a morte tal como é inútil lutar contra a vida.
fonte: Diário de Notícias, 30.09.2007

Os livros deviam ser publicados anonimamente, sem nome de autor. Isso eliminaria imensos problemas.
fonte: Diário de Notícias, 30.09.2007

Não se trata de viver noutro planeta, mas a verdade é que, quando estou a escrever, a minha vida muda por completo. Encontro uma razão, um motivo e uma direcção.
fonte: Visão, 27.09.2007

Não sei se morremos assim. Não sei se não ficamos cá. Não sei se Camões está morto. Mas isso não tem importância nenhuma, eu não sou importante, os livros é que são importantes.
fonte: Visão, 27.09.2007

Eu agora tinha a morte dentro de mim. E é horrível estar grávido da morte..
fonte: Visão, 27.09.2007

A morte é sempre uma puta e, a uma puta, não se pode dar confiança.
fonte: Visão, 27.09.2007

Estive muito perto da morte e palavra de honra que é mais fácil do que se imagina.
fonte: Visão, 27.09.2007

Ninguém escreve assim. Não tenho a menor dúvida de que não há, na língua portuguesa, quem me chegue aos calcanhares.
fonte: Visão, 27.09.2007

Tenho a certeza de que os meus livros são muito mais importantes do que qualquer Nobel que me possam dar.
fonte: Visão, 27.09.2007

Um prémio nada tem a ver com a literatura, na medida em que não melhora nem piora os livros.
fonte: Visão, 27.09.2007

É preciso viver, viver como homem comum entre homens comuns. Só um homem comum pode fazer grandes coisas.
fonte: Courrier Internacional, 01.2007

O que acontece, porém, é que toda essa história das definições de géneros cada vez me interessa menos. Quando se começa um livro, é isso que se quer fazer, um livro, um livro total que tenha tudo, poesia, prosa, tudo: a vida.
fonte: Courrier Internacional, 01.2007

Lamento que pessoas com talento tenham de trabalhar noutra profissão e só possam escrever à noite e aos fins-de-semana.
fonte: Courrier Internacional, 01.2007

Como quando estamos em bicos de pés à procura de coisas em cima dos armários, os livros andam por aí à espera que alguém os escreva.
fonte: Jornal de Letras, 25.10.2006

Só podes começar um livro quando tens a certeza que não vais ser capaz, porque só então escrever se torna uma luta com o material, e a tua vida se vai estreitando porque estás de tal modo habitado pelo livro, numa relação simbiótica, que formas corpo com ele.
fonte: Jornal de Letras, 25.10.2006

Não podes escrever e fazeres outra coisa. Não se podem fazer bons  livros a ser-se jornalista, médico ou o que quer que seja.
fonte: Jornal de Letras, 25.10.2006

Não vale a pena escreveres se não for para seres o melhor.
fonte: Jornal de Letras, 25.10.2006

Só ficas adulto depois do teu pai morrer, porque deixou de existir a última coisa que existia entre ti e a morte.
fonte: Jornal de Letras, 25.10.2006

Tenho de os ler [aos livros que gosta] duas, três, quatro vezes; há sempre muitas coisas que perdemos na primeira leitura.
fonte: Jornal de Letras, 25.10.2006

Cada vez gosto mais de ser português e cada vez tenho mais orgulho no meu país. É-me insuportável ouvir dizer «somos um país pequeno e periférico». Para mim Portugal é central e muito grande.
fonte: Jornal de Letras, 25.10.2006

Num livro mau, a pessoa escreve aquilo que quer escrever. Num livro bom a pessoa escreve aquilo que o livro quer que seja escrito.
fonte: entrevista na RTP 2, programa Por outro lado, 04.04.2006

Queria que cada página fosse um espelho [para o leitor].
fonte: entrevista na RTP 2, programa Por outro lado, 04.04.2006

O que eu queria era pôr a vida toda entre as capas de um livro.
fonte: entrevista na RTP 2, programa Por outro lado, 04.04.2006

Como aquilo que aconteceu ao Camões: o que é que eu quero?, é dar trabalho para quinhentos anos aos críticos.
fonte: entrevista na RTP 2, programa Por outro lado, 04.04.2006

Eu não sei o que é que é light, sei que é light em relação a cigarros. Há literatura, e não há literatura. Pois a literatura não é isso, é uma coisa nobre, a literatura é o que faz o Dostoievski.
fonte: entrevista na RTP 2, programa Por outro lado, 04.04.2006

Eu duvido que um leitor de maus livros vá ler livros bons.
fonte: entrevista na RTP 2, programa Por outro lado, 04.04.2006

Eu pergunto-me se é possível entrevistar um escritor. Acho que não é porque ele é muita gente. E é muito difícil apanhar essa multidão toda.
fonte: entrevista na RTP 2, programa Por outro lado, 04.04.2006

Todos nós somos muitos.
fonte: entrevista na RTP 2, programa Por outro lado, 04.04.2006

Em geral, as entrevistas são piores do que as pessoas.
fonte: entrevista na RTP 2, programa Por outro lado, 04.04.2006

Quando morre um pai, tem-se a sensação de que, na próxima vez que a morte aparecer à porta, seremos nós a abri-la.
fonte: Visão, 27.02.2006

Os bons escritores são pessoas que não mentem no seu trabalho.
fonte: Visão, 27.02.2006

O que me preocupa são os autores que dizem que «puseram os portugueses a ler». Isso é mentira. Puseram, isso sim, os portugueses a lerem-nos a eles - e isso não é ler.
fonte: Visão, 27.02.2006

Há mais artistas do que obras de arte.
fonte: Visão, 27.02.2006

Só vale a pena começarmos um romance quando temos a certeza de que não somos capazes de o fazer.
fonte: Diário de Notícias, 17.02.2006

Pensar é ouvir com atenção. Para escrever é preciso escutar a voz que dirige a mão.
fonte: Diário de Notícias, 17.02.2006

O grande artista traz uma forma diferente de colorir.
fonte: Diário de Notícias, 17.02.2006

Já reparou como os desenhos das crianças são fascinantes até aprenderem a perspectiva? Quando começam a desenhar a três dimensões, perde-se tudo.
fonte: Diário de Notícias, 17.02.2006

... são precisas muitas mulheres para esquecer uma mulher inteligente.
fonte: Diário de Notícias, 17.02.2006

Teria dificuldade em viver com uma mulher que escrevesse. Eu nunca seria o mais importante na vida dela, viria sempre depois dos livros.
fonte: Diário de Notícias, 17.02.2006

Um bom livro é o que foi escrito só para mim.
fonte: Diário de Notícias, 17.02.2006

É mentira que exista liberdade total de expressão, uma vez que os próprios jornais fazem censura, a censura interna, o que é natural pois eu não posso dizer mal do dono do meu jornal.
fonte: Póvoa Semanário, Fevereiro de 2006

É próprio do homem não viver livre em liberdade, mas viver livre numa prisão, e já é muito bom.
fonte: Póvoa Semanário, Fevereiro de 2006

Um bom livro ajuda-te, ilumina-te, dá-te a beleza que não encontras em ti. Agora, por exemplo, já se começa a ler aos doentes enfermos. A arte pode ajudar a salvar-te a vida.
fonte: Agência Lusa, 10.11.2005

Ainda que o tradutor tenha génio, uma tradução é sempre uma foto a preto e branco de um quadro.
fonte: Agência Lusa, 10.11.2005

Um bom livro tem a sua própria chave e o seu manual de instruções.
fonte: Agência Lusa, 10.11.2005

Tens obrigação de escrever para os que não têm voz, para os que não conseguem falar, as mulheres casadas, por exemplo, que são as mais infelizes do mundo.
fonte: Agência Lusa, 10.11.2005

Os fins-de-semana são horríveis para os casamentos. Em Portugal resolveram o problema com um jornal enorme, que vem em saco plástico.
fonte: Agência Lusa, 10.11.2005

Eu adormeço a ler. E há aqueles momentos entre o dormir e o acordar em que começo a ler outras coisas que não estão lá, começo a fazer outro livro. Vinha notando isto e pensei escrever conseguindo um estado próximo deste, em que os meus mecanismos lógicos não funcionam e as palavras flúem através da mão. São as palavras que se geram umas às outras.
fonte: Diário de Notícias, 09.11.2004

Aprende-se a escrever, lendo.
fonte: Diário de Notícias, 09.11.2004

A palavra carne é sempre a mesma, depende das palavras que se põem antes e das palavras que se põem depois. Para que as pessoas sintam o gosto na boca eu tenho que trabalhar como um cão, até encontrar as palavras exactas antes e depois.
fonte: Público, 09.11.2004

Nós somos casas muito grandes, muito compridas. É como se morássemos apenas num quarto ou dois. Às vezes, por medo ou cegueira, não abrimos as nossas portas.
fonte: Diário de Notícias, 09.11.2004

Viver é muito perigoso, mas é um privilégio estar vivo, sobretudo para quem tem, como eu, um único objectivo: escrever. E isso salva-me de muita coisa.
fonte: Diário de Notícias, 09.11.2004

Com o passar do tempo, há dois sentimentos que desaparecem: a vaidade e a inveja. A inveja é um sentimento horrível. Ninguém sofre tanto como um invejoso. E a vaidade faz-me pensar no milionário Howard Hughes. Quando ele morreu, os jornalistas perguntaram ao advogado: «Quanto é que ele deixou?» O advogado respondeu: «Deixou tudo.» Ninguém é mais pobre do que os mortos.
fonte: Diário de Notícias, 09.11.2004

Não fomos feitos para a morte, a não ser para a morte voluntária. A involuntária sempre me pareceu uma tremenda injustiça, para não falar em crueldade.
fonte: Diário de Notícias, 09.11.2004

Uma coisa é o amor, outra é a relação. Não sei se, quando duas pessoas estão na cama, não estarão, de facto, quatro: as duas que estão mais as duas que um e outro imaginam.
fonte: Diário de Notícias, 09.11.2004

É mais sensual uma mulher vestida do que uma mulher despida. A sensualidade é o intervalo entre a luva e o começo da manga.
fonte: Diário de Notícias, 09.11.2004

Temos de aceitar que há livros muito bons de que não gostamos e livros de que gostamos que podem não ser bons.
fonte: Diário de Notícias, 09.11.2004

Saber ler é tão difícil como saber escrever.
fonte: Diário de Notícias, 09.11.2004

O próprio do homem é viver livre numa prisão. Estamos sempre condicionados e até prisioneiros de nós próprios.
fonte: Diário de Notícias, Novembro 2004

Isto às vezes é tremendo porque a gente quer exprimir sentimentos em relação a pessoas e as palavras são gastas e poucas. E depois aquilo que a gente sente é tão mais forte que as palavras...
fonte: Público, 09.11.2004

Qualquer entrevista é muito inferior a um livro. O livro permite corrigir-se. A entrevista necessariamente está cheia de lugares comuns.
fonte: Público, 09.11.2004

O livro é escrito por duas pessoas: por mim e pelo leitor.
fonte: Diário de Notícias,  18.11.2003

A cultura assusta muito. É uma coisa apavorante para os ditadores. Um povo que lê nunca será um povo de escravos.
fonte: Diário de Notícias, 18.11.2003

Só há grupos onde existem fraquezas individuais.
fonte: Diário de Notícias, 18.11.2003

Quando lemos um bom escritor é para nos conhecermos a nós mesmos.
fonte: Público, 15.11.2003

Às vezes é difícil dizer que uma pessoa tem um coração em cada objecto.
fonte: Diário de Notícias, Novembro 2003

Seria incapaz de dizer mal de um livro. Mesmo que o livro fosse desonesto, mesmo que o livro fosse mau, não falaria sobre ele. Portanto, se fosse crítico literário era uma maçada porque quase não tinha sobre que escrever.
fonte: Diário de Notícias, Novembro 2003

As pessoas compram aquelas coisas [livros] que falam sobre o hoje e quando o hoje se tornar ontem já ninguém vai ler aquilo.
fonte: Diário de Notícias, Novembro 2003

Sinto uma consideração quase nula pelo que, em Portugal, se publica. Desgosta-me a infinidade de romances desonestos, entendendo por desonestidade não a falta de valor intrínseco óbvio (isso existe em toda a parte) mas a rede de lucro rápido através da banalização da vida. Livros reles de autores reles.
fonte: Visão,  07.08.2003

Ler é um acto de prazer.
fonte: Diário de Notícias, 2003

Não me importaria de ser condenado a prisão perpétua se tivesse livros e papel para escrever.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

Escrever é como uma droga. Começa-se por puro prazer e acaba-se por organizar a vida como os drogados, em torno do vício. [...] até quando sofro vivo isso como um desdobramento: o homem está a sofrer e o escritor está a pensar como aproveitar esse sofrimento para o seu trabalho.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

Não descrevo os personagens, apenas algum detalhe, o cabelo, as mãos, algo assim, porque a descrição limita-me. O leitor tem de imaginar os personagens.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

Nunca conseguirei o romance que quero fazer porque, primeiro, se o fizer, para quê continuar a escrever?; depois, porque é uma luta constante com as palavras, com a resistência das emoções, mas esse é precisamente o encanto do meu trabalho.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

Escrever protege do sofrimento. Quando estou a sofrer e escrevo, não sou só esse homem que sofre, sou também o escritor que está a pensar como aproveitar esse sofrimento para o trabalho.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

Porque se escreve? Pergunta a uma macieira  porque dá maçãs.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

Não se pode escrever para ter êxito. Se é isso que se procura, o melhor é começar a cantar.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

Quando escrevo, é claro que sofro, mas também tenho muito prazer a escrever e gostaria que os meus leitores também sentissem esse prazer.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

Hoje, os escritores jovens querem ser lidos na segunda-feira, ser publicados na terça, ter um êxito extraordinário na quarta e na quinta ser traduzidos em todo o mundo.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

Viver é como escrever sem corrigir.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

Viver diverte-me muito. Nunca me aborreço quando estou sozinho.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

Ninguém é bom ou mau na cama. Se há um problema sexual, é outra coisa, mas senão há problemas concretos, basta que se goste muito de uma mulher; se isso acontece, ela é a melhor na cama..
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

No amor podemos substituir uma pessoa por outra, mas não na amizade, porque cada amigo tem o seu lugar e não podemos substitui-lo.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

Penso que as mulheres são mais ciumentas do trabalho que das outras mulheres. Mas eu entendo isso. Eu não gostaria de viver com uma mulher que escrevesse porque, se fosse como eu, estaria tão concentrada no trabalho que não existiria mais nada.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

Há momentos e situações em que o olhar comunica mais que as palavras, isso também é intimidade. Creio que sou capaz de dizer muitas cosas sem falar, é o outro que também tem de compreender e de saber interpretar. Quando se estabelece essa relação de intimidade e de amizade, não é necessário falar. [...] frequentemente é melhor não o fazer porque as palavras estão muito gastas.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

A amizade é regida pelo mesmo mecanismo que o amor, é instantânea e absoluta.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

Creio que os escritores em geral não trabalham muito os seus livros, não os corrigem. E é uma pena porque, por vezes, trata-se de uma única palavra, mas uma palavra que pode ser fundamental.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

Com cada novo livro afloram todas as fragilidades e problemas do escritor.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

O autor não deve ser protagonista do seu livro porque o leitor não tem de notar que o escritor está ali, este tem de se tornar invisível.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

Tenho uma enorme inveja dos poetas. [...] Ninguém escreve romances como eu, mas sou um poeta falhado. [...] Talvez os bons romancistas sejam poetas falhados. Não sei.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

Não existem livros maus, para mim, um livro merece sempre respeito. Há tanta esperança, por vezes sofrimento e até a saúde do autor... Eu agradeço os livros que me mandam, antes de os ler, para não ter de mentir, porque as pessoas não têm sentido autocrítico. Se lhes digo: «Eu não gostei do seu livro...», confundem-se a eles com o produto e consideram-no como algo pessoal. Se fosse crítico, criticaria só os livros de que gostasse, porque se pode fazer muito mal, as pessoas ficam muito mal quando recebem uma crítica adversa; é muito doloroso.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

O Partido Comunista é uma Igreja, com a sua fé, as suas tradições e a sua hierarquia. Não mudou.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

Vivemos numa época em que a ideologia é uma ideologia de produção e [os comunistas] não compreenderam que o poder não está nas mãos de nenhuma ideologia, mas das multinacionais: quem produz está bem; quem não produz, é expulso.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

Não gosto de ir a determinados ambientes, porque também me dou conta de que há um terror reverencial que impede a proximidade. Estão sempre à espera que diga coisas inteligentes e, por sua vez, protegem-se não falando.
fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002

A única forma de abordar os romances que escrevo é apanhá-los do mesmo modo que se apanha uma doença.
fonte: Segundo Livro de Crónicas, 2002

Mesmo as pessoas que escrevem para os jornais, que no dia a seguir servem para embrulhar o peixe frito, devem medir as palavras por respeito à língua e a nós mesmos.
fonte: Diário de Notícias, 08.12.2001

A vida faz-me sentido enquanto trabalho.
fonte: Diário de Notícias, 08.12.2001

A forma como lidamos com o fim é muito judaico-cristã, muito ligada à ideia do cadáver e do horrível ritual da morte. Tentei sempre, em relação aos meus mortos, guardar a imagem da pessoa viva, nunca os quis ver depois de terem morrido.
fonte: Diário de Notícias, 08.12.2001

A morte das pessoas de quem gostamos amputa-nos.
fonte: Diário de Notícias, 08.12.2001

Nós morremos quando desaparecem as últimas pessoas que ouviram falar de nós.
fonte: Diário de Notícias, 08.12.2001

Durante anos, mesmo em relação a jornalistas, tentaram à força colar-me a imagem que imaginavam que eu fosse, ainda agora. […] Sou arrogante, mal-educado, rebelde, geralmente sou sempre o António Lobo Antunes somado a qualquer coisa desagradável. Não corresponde a nada do que sou, a nada.
fonte: Diário de Notícias, 08.12.2001

A loucura é exceder os limites impostos pelos médicos, limites que variam muito de caso para caso.
fonte: Diário de Notícias, 08.12.2001

A gente não pode compreender os sentimentos sem o contrário deles.
fonte: Expresso, 07.11.1998

O desgosto é a melhor forma de assassínio por nunca se encontrar a arma do crime.
fonte: Livro de Crónicas, 1998

Não sou um senhor de idade que conservou o coração menino. Sou um menino cujo envelope se gastou.
fonte: Livro de Crónicas, 1998

Um parvo em pé vai mais longe que um intelectual sentado.
fonte: Livro de Crónicas, 1998

Esquecer uma mulher inteligente custa um número incalculável de mulheres estúpidas.
fonte: Livro de Crónicas, 1998

Muitas vezes, põem-se meninos e meninas de vinte anos a escrever críticas. E há outros que também escrevem romances. É muito raro aparecerem bons romances antes dos trinta anos, muito raro. Um tipo só pode fazer uma coisa de jeito depois de ter passado pelas coisas. Se não viveu, os livros até podem estar «tecnologicamente» correctos, mas não há ali mais nada. A experiência de vida cada vez mais me parece fundamental.
fonte: Ler, 1997

Eu gosto desta terra. Nós somos feios, pequenos, estúpidos, mas eu gosto disto.
fonte: Ler, 1997

Faz-me imensa confusão a polémica crítica versus escritores. Para mim, o problema é muito simples: a maior parte dos escritores não sabem escrever e a maioria dos críticos não sabe ler. E também há muita ignorância e má-fé de parte a parte. A sensação que tenho é que ando há que tempos a ensinar os meus críticos a ler e eles não há meio de aprenderem.
fonte: Visão, 26.09.1996

O que me interessa são pessoas que tenham uma espessura de vida. Interessa-me pouco o romance filosofante, esses livros imóveis onde as personagens são todas cérebro e não têm vida, nem sangue, nem esperma.
fonte: Diário de Notícias, 27.04.1994

Não consigo conceber uma história onde as personagens não tenham carne. E se eu partir de uma carne já real para mim, torna-se muito mais fácil.
fonte: Expresso, 07.11.1992

O que é escrever? No fundo é estruturar o delírio, e tem graça porque quando se trata o delírio o que aparece sempre é uma depressão subjacente.
fonte: Expresso, 07.11.1992

Quando escrevo, penso apenas em exorcizar certas emoções, descrevê-las, vivê-las. O leitor é um acto secundário, penso nele nos últimos acabamentos do livro, quando sinto que isto ou aquilo não está inteligível.
fonte: O Jornal, 30.10.1992

No fundo, um escritor é um bocado um ladrão, um gatuno de sentimentos, de emoções, de rostos, de citações. Um livro é sempre feito de pequenos roubos com a vantagem de não sermos condenados.
fonte: O Jornal, 30.10.1992

Eu penso que aquilo que faz com que nós continuemos vivos e capazes de criar é isso mesmo, uma inquietação constante. Sem ela não pode haver criação, quem não põe sempre tudo em causa, arrisca-se a ter uma vida interior de três assoalhadas, num bairro económico.
fonte: O Jornal, 30.10.1992

Todos nós, homens e mulheres, não somos, de facto, tão diferentes, senão aquilo que escrevemos ou pintamos não teria nenhum impacto nos outros. Afinal, o que nos faz aderir a um livro é pensar «É mesmo isto que eu sinto e não era capaz de exprimir», não é?
fonte: O Jornal, 30.10.1992

Custa-me conceber um poeta que nunca tenha feito amor. E às vezes quando leio certos prosadores portugueses, não têm esperma nenhum lá dentro, são tudo coisas que se passam dentro da cabeça. Pensam muito. E a literatura faz-se com palavras.
fonte: Público, 18.10.1992

No fundo o que é um maluco? É qualquer coisa de diferente, um marginal, uma pessoa que não produz imediatamente. Há muitas formas de a sociedade lidar com estes marginais. Ou é engoli-los, transformá-los em artistas, em profetas, em arautos de uma nova civilização, ou então vomitá-los em hospitais psiquiátricos.
fonte: Público, 18.10.1992

Eu penso que em literatura não há palavrões.
fonte: Jornal de Letras, 05.04.1988

Quando escrevo, tenho uma sensação de gravidez. Os homens invejam a gravidez das mulheres. Freud não falou disso, falou da inveja de pénis das mulheres, mas não da inveja da gravidez dos homens. Para mim, a única forma de responder a esta inveja é escrever um livro.
fonte: Francis Utéza, Seminário de Montpellier da Universidade Paul-Valéry, Novembro 1983

Em Portugal, se quiserem uma boa crítica escrevam um livro obscuro, que ninguém vai ler, que ninguém vai comprar: dirão bem de vocês, porque não são um potencial concorrente...
fonte: Francis Utéza, Seminário de Montpellier da Universidade Paul-Valéry, Novembro 1983

Deveríamos mudar A Bíblia, onde diz: “no começo era o Verbo”, deveria dizer: “no começo era a depressão”. A nossa vida é uma espécie de luta contra a depressão, até à depressão final, a morte.
fonte: Francis Utéza, Seminário de Montpellier da Universidade Paul-Valéry, Novembro 1983

Um escritor é, por natureza, um carenciado de afecto.
fonte: Jornal de Letras, Novembro 1985

Mas houve livros chatos como o da Agustina Bessa Luís e o do Virgílio Ferreira que os académicos e os universitários devem achar muito bons, eu, como não sou nem académico nem universitário acho-os terrivelmente chatos.
fonte: Jornal de Letras, 1984

Se um escritor não agarra o leitor pelas tripas logo nas primeiras páginas, está feito ao bife. Céline é um desses, agarra-nos logo.
fonte: Jornal de Letras, Novembro 1983

[escrever] Dá um trabalho do caraças! Despentear a prosa de maneira que aquilo seja feito como uma diarreia.
fonte: Jornal de Letras, 1983

(...) penso no absurdo de escrever. De estar a escrever quando podia estar com os amigos, ir ao cinema, ir dançar que é uma coisa de que gosto... mas não, um tipo está ali e é um bocado esquizofrénico. (...) Há sempre uma parte subterrânea nas obras de arte impossível de explicar. Como no amor. Esse mistério é, talvez seja, a própria essência do acto criador. (...) Quando criamos é como se provocássemos uma espécie de loucura, quando nos fechamos sozinhos para escrever é como se nos tornássemos doentes. A nossa superfície de contacto com a realidade diminui, ali estamos encarcerados numa espécie de ovo... só que tem de haver uma parte racional em nós que ordene a desordem provocada. A escrita é um delírio organizado.
fonte: Jornal de Letras, Janeiro 1982


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