Emanuel Moreira - opinião sobre Não Entres Tão Depressa Nessa Noite Escura

Em sete actos Deus criou o Universo e a Terra, e nesses sete actos criativos o autor criou a Maria Clara. Maria Clara, o homem da casa, Clarinha, menina, e tudo menos Clara.

Ao longo do livro há toda uma sucessão de criação e destruição, cenários idílicos de um universo de fadas que alberga uma quantidade imensa de fotões no meio de uma real noite escura, onde manchas de óleo, que não óleo, impregnam o universo da narradora. Falar do enredo pouco importa em Lobo Antunes, Maria Clara, entre o psicólogo e o seu diário dá espaço a que toda a sua história tome lugar nas mais variadas perspectivas, e no balanço do enleio fica difícil perceber até que ponto a Clarinha não é apenas louca. Um sotão com um passado supostamente fechado. Um pai no hospital em que vai ser operado ao coração, acordando, uma lâmpada no tecto. A irmã, Ana Maria, que tão bela, loira, e ao contrário da Clarinha, tão filha de sua mãe. Uma avó que se perde no vício do jogo e do álcool e que para a empregada Adelaide, menina, ao contrário da sua filha, mãe de Maria Clara, que Senhora, não suporta o cheiro da pobreza. O avô a cegar, com uma bengala que quase varinha de condão. Tudo isto são meros traços, não necessariamente verdadeiros. 

Afinal, como é habitual em ALA o leitor é que tem de usar a sua chave para aceder às respostas. Tal como a Maria Clara contava as voltas na fechadura do sotão, no fim é díficil não sermos nós também a tocarmo-nos no vidro.


por Emanuel Moreira
23.04.2015

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