Santiago Pérez Isasi: opinião sobre O Esplendor de Portugal
António Lobo Antunes, para quem não o conhece, é o outro grande romancista Português da segunda metade do século XX (o "outro", sendo o "tal" supostamente, é José Saramago). Na verdade, isso já é uma opinião muito pessoal, Lobo Antunes é mais romancista que Saramago. Saramago será sempre, na minha opinião, um intelectual comprometido que escreveu romances, enquanto que a Lobo Antunes se reconhece como o romancista "de raça" (expressão tão feia), que por vezes faz o seu papel de intelectual.
Comenta-se muito que Lobo Antunes é um eterno candidato ao prémio Nobel, e quem sabe não venha acabando por recebê-lo. Na verdade, eu acho que ele o merece. No entanto, acho que não conseguirá ter esse favoritismo do público em geral, porque não é de todo um autor fácil. O que Lobo Antunes oferece em seus romances (e em O Esplendor de Portugal em particular) é a consciência nua das suas personagens: o discurso da memória, saltando entre diferentes tempos e entre os diferentes níveis (o consciente, o inconsciente, o recalcado) e que vai reconstruindo histórias, mas não uma história no sentido tradicional.
Lobo Antunes exige um leitor não apenas activo, mas também atento, sensível e paciente, porque o que cria são mundos psicológicos e simbólicos através dos quais é possível reconstruir os factos que os provocaram. Neste caso, são quatro as personagens em cujas mentes mergulhamos: uma família constituída por Isilda, a mãe, que resiste isolada na Angola pós-descolonização, e os três irmãos, Rui, Clarisse e Carlos, que regressam a uma Lisboa que já não lhes pertence e que alimentam os seus ódios e ressentimentos mútuos.
O Esplendor de Portugal, como dizia, não é um romance para todos os públicos, não porque descreva cenas horríveis (tem alguma coisa) ou cenas de sexo impudicas (também), mas pela sua estrutura e o seu estilo desarticulado, poético, combinatório, fragmentado, desorganizado, disperso. Entrar no ritmo e no universo que propõe o romance não é fácil; uma vez reconstruído com as peças essenciais (quem é quem, quais as relações entre si, quais são as suas falhas ou segredos escondidos...) a sua leitura torna-se mais suportável, e muito mais profunda. É uma experiência emocionante; muito mais, francamente, do que da maioria dos romances de Saramago que li.
A nota idiota em conclusão: cada vez que eu lia no livro o nome de Clarisse, não conseguia evitar de lembrar-me do filme O Silêncio dos Inocentes: "Quid pro quo, Clarice"... O mal que Hollywood faz às nossas mentes...
por Santiago Pérez Isasi
18.10.2011
[traduzido do castelhano por José Alexandre Ramos]
[traduzido do castelhano por José Alexandre Ramos]
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